MEU SILÊNCIO

Faz tempo que o silêncio reina aqui.

Eu apostei tanto neste ano. Apostei sonhos e o meu coração. Apostei tudo, mas nem por isso me arrependo do que perdi no caminho. 

Eu sei que tu não tens nada a ver com isso, mas eu fiquei doente e permaneci nesse estado por um bom tempo. Descolei a retina e ainda estou lutando para não ficar cega de vez de um olho. A parte boa disso é que eu conheci bons oftalmologistas, que me fizeram perder o medo de médico e de cirurgia. Aliás eu operei em 3 fatídicos dias. 1 de julho, 1 de setembro e 16 de dezembro. Sim, eu estou de cama agora e isso me parece algo bem natural depois de tudo que o descolamento me causou. Sai fora dá caixa e ouvi tantas histórias, vi tantos rostos novos... vi gente em estado de muita dor sorrindo tão verdadeiramente. E eu, me entristecendo por tão pouco. Eu precisava pensar. Não de uma forma clichê, porque cada um sabe das coisas do seu coração. Só tu sabes quão difícil é cada passo dá tua vida. Mas eu realmente precisava trabalhar com proporções. E esse foi o único motivo do meu silêncio.

Eu tentei escrever ao menos um poema durante esse tempo, mas tudo isso sugou minha inspiração. Eu pensei (e só pensei) sobre minha vida. Mas quando estou confusa, posso invocar de todas as formas a presença de Drummond, mas sou ignorada. Então, eu calei. Calei aqui e calei dentro de mim, que são os lugares onde eu me entrego sem culpa.

Eu ainda não tenho minha inspiração de volta. Não consigo me descrever em um poema e eu não quero fazer algo sofrido que faça parecer que estou ouvindo brega em um bar de Manaus. 

Eu não quero continuar em silêncio aqui. E nem quero ficar tentando empurrar na tua garganta coisas triviais. Afinal, alguém além de mim, apostou que isso iria ser legal. "Poxa! Pelo amor, Ana. Vai desistir?" Eu não vou mentir. Não teve um dia sequer que eu não tenha pensado no que eu poderia escrever. Eu me dediquei a outra parte do meu mundo, mas eu sempre estava tentando formar um verso. E nesse momento, todas as coisas confusas da minha atual vida vinham para bagunçar ainda mais aqui dentro. Nem verso, nem frase... Um suspiro, talvez. Mas seria o suficiente? Então continuei calada.

A muito tempo eu aprendi que o desespero só nos deixa cegos e surdos. Eu estava sim aflita, mas por fora eu queria continuar plena. Plena como o vento que sopra no alto de uma montanha. De fato, eu nunca estive no alto de uma montanha de verdade. Mas eu já estive no Cascudão, que é um morro alto de areia, de onde se vê a linha do mar longe e infinita. E de lá, também se vê todo o Guajiru. Belo e silencioso. O vento que sopra no Cascudão é um vento forte, denso pela maresia. Mas ele é leve. Faz dançar os cabelos. Tem um intenso assobio, mas ainda assim, esse foi o silêncio mais verdadeiro que eu já pude sentir. 

E por todas essas semanas, eu procurei ser o silencioso vento que samba sobre a areia grossa do Cascudão. 

O descolamento foi sim uma tragédia que me trouxe muitas dores amargas, mas ele também me trouxe um autoconhecimento surreal. Eu não conhecia esta pessoa que lhe escreve hoje. Ela estava muito bem guardada em mim. Ela me trouxe de volta uma Ana infantil para as coisas do mundo, mas muito mais forte para as guerras que tenho que travar dentro de mim.           

Engraçado, agora estou me adaptando ao mundo embaçado da visão monocular, mas deste ponto, eu vejo tão melhor a minha vida. 


Comentários

  1. Oi, Ana!
    Estive acompanhando sua trajetória por um tempo, através do Instagram, e confesso que sempre queria saber um pouquinho mais da sua condição, e de como você estava, afinal, de certo modo, me preocupa. Minha irmã tem uma doença degenerativa, e um dia precisará de transplante de córnea. Vejo como ela tem ficado triste, mas sorrindo. E "ver" em você essa felicidade de estar viva é algo incrível.
    Mas, como você disse: cada um sabe a dor e a luta que enfrenta diariamente, principalmente as que estão dentro de si mesmo.

    Ana, quero que saiba que tem mais uma pessoa neste mundo torcendo por você: EU.
    Torço por você e pela sua recuperação. Torço para que você melhore, mas continue se conhecendo e redescobrindo a cada dia!

    Que este ano seja mais leve e doce, e que Deus ilumine seus caminhos, sempre!


    Um beijo! <3

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    1. Jey, que coisa mais agradável ler seu comentário tão lindo.
      Carinhos assim me motivam a continuar sonhando e buscando ser alguém melhor.
      Torço para que sua irmã esteja sempre firme e alegre, apesar da dor de se imaginar sem visão. Acredite, é algo que nos tira o sono. Quando eu precisei da cirurgia e de um tratamento, era tudo muito caro e como mágica, estava tudo encaminhado e eu fiz tudo pelo SUS. Rezo para que quando sua irmã precisar, esteja tudo encaminhado também e que os anjos afaguem o coraçãozinho dela para que ela não tenha medo.
      Que seja um ano maravilhoso para nós e que possamos aprender muito e evoluirmos como pessoas a cada dia.

      Muito obrigada pelo carinho, por me acompanhar e por me deixar saber.

      Grande Beijo.

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